Acordei e olhei pela janela:
chuvarada dos diabos.
Senti que o dia iria ser complicado.

Às 10h minha dentista me esperava.
Escovei os dentes 7 vezes,
passei fio dental umas 4 e fui.

Sentei naquela cadeira anti-anatômica e a festa começou. VVVVVVVRRRRRRRIIIIIIIIHHHHHHHHHHHNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNN!
e DÁ-LHE BROCA:
VVVVVVVRRRRRRRIIIIIIIIHHHHHHHHHHHNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNN!
"Não tá doendo, né?"
VVVVVVVRRRRRRRIIIIIIIIHHHHHHHHHHHNNNNNNNNNNNNNNNNNNNNN!

Duas ampolas de anestesia,
vários lenços de papel,
e 120 minutos depois, ela disse:
"-Estas resinas modernas são ótimas,
porque não tiram a sensibilidade do dente.
Mas não se preocupe,
pois a tendência é que você desenvolva uma tolerância a esta dor residual..."

Cheguei no treino atrasado, rezando por não mais que uma corridinha leve.
Minha treinadora anunciou, então:
-"Hoje começam os treinos para corrida com obstáculos."
Alinhou as barreiras e disse:
-"PULEM!"

Maravilha, metade do dia pela frente e já fui torturado duas vezes.

Em 1976 jogava na defesa do Internacional um jogador chamado Figueroa.
Ele ficou famoso não pela qualidade de seu futebol, mas por sua falta de caráter e deslealdade dentro do campo.
Sua jogada característica era o cotovelaço na boca ou no nariz do atacante adversário.
O juiz nunca percebia nada e a torcida colorada se regozijava de sadismo.

Figueroa dominava a bola, perto de sua área, e a levava até próximo da bandeira de escanteio,
ficava de costas para o campo e esperava que o atacante adversário viesse cercá-lo.
E lá ía um desavisado centroavante do Passo Fundo, por exemplo, que ganhava não mais que um salário mínimo,
tentar tomar a bola de Figueroa.
As sociais do Beira-Rio entravam em um frenesi macabro. "Ele vai fazer! Ele vai fazer!",
sussurravam os colorados a seus filhos de onze anos.

E, de repente, sem ninguém entender como,
aquele atleta semi-amador do Passo Fundo estava estirado no chão.
Com um nariz quebrado, ou com um dente a menos na boca, ele gemia de dor.
Ninguém escutava nada, no entanto, pois os colorados estavam de pé,
gritando e se vangloriando por seu zagueiro que saía jogando calmamente.
E o juiz meio confuso, mandava seguir o jogo.

Anos mais tarde, Figueroa já velho, morando em seu Chile natal, foi chamado para treinar o Internacional.
O time ía mal no campeonato brasileiro e os dirigentes, que tinham 11 anos em 76,
buscaram o homem que seus pais admiravam.
Figueroa estreiou vencendo o Santos na Vila Belmiro, depois teve algumas derrotas,
concedeu inspiradas entrevistas, depois faltou alguns treinos,
daí obteve uns empates, cancelou os treinos pela manhã e, no final,
o Internacional ficou em uma posição intermediária na tabela de classificação.

O campeonato acabou e Figueroa voltou ao Chile.
Os dirigentes colorados deram graças a Deus de se livrarem de um treinador tão preguiçoso.
Ainda pagaram o salário dele por mais oito meses,
se perguntando:
"Era mesmo este homem que nós idolatravamos na infância?

Eu não sei.
Eu torcia pro cara que limpava o sangue do nariz e voltava pro campo prá jogar futebol.

O Dr. Cordiólis já estava lá pelo quilômetro 10, completamente exausto, caminhando a um bom tempo, quando passou por ele um outro corredor, "dando letrinha".
Ser ultrapassado já não é muito bom e quando o ultrapassador ainda faz o gênero bom samaritano é duplamente irritante.
"Vamochhh lá, meu galo, não desishhhta".

O Dr. Cordiólis percebeu que estava sendo ultrapassado por um corredor muito mais fora de forma do que ele, e emendou:
"Só tô te dando uma luz, aproveita."
"Ishhhto é o que vamoshhh verrr!"

O Dr. Cordiólis então respirou fundo, se preparou psicologicamente e começou a correr.
Entre o Posto 1 e o Shopping Riosul, deu o maior pique de toda a sua vida.
E, quando ultrpassou o rival, usou todas suas forças para para falar, bem calmo,
"Me pega agora, gordinho!"

E foi sumindo do alcance, receoso que o gordinho tentasse.

Acordei às 6:38, dois minutos antes do despertador.
Tomei banho, lavei a cabeça e fiz a barba.
Calcei meias novas, Asiscs novo e aquele velho nervosismo.

Às sete horas, a primeira turma, com camisetas "Corredores da Rocinha", alinhou junto ao partidor.
Nós só começamos a correr às 9:40 e levou mais 8 minutos até chegarmos a largada.
Acima dos 14.000 corredores estava a Pedra da Gávea e, acima dela, um sol de 30 graus.

Atacamos a lomba da Niemeyer, ziguezagueando a multidão.
Vidigal, Sheraton, e daí lomba abaixo.
Cheguei ao Leblon me sentindo muito bem, lado a lado com meu irmão Christiano.
O Dr. Cordiólis ficara para trás.

Ipanema e Cobacabana passaram por nós a 4:56 minutos por quilômetro.
Desgarrei de meu irmão, que sentiu o calor.
Botafogo e o início do Aterro do Flamengo me custaram mais alguns segundos de média.
5:06 por quilômetro, só faltavam mais quatro km e o calor piorou um pouco.

No meio do km 17 o "urso" subiu no meus ombros.
A média caiu para 5:22.
Arrastei uma tonelada em cada perna até a chegada...
21,095km em 1:48:19.


ETA MEIAZINHA SOFRIDA!

Viajar com um irmão é sempre uma "aventura".
Só que se, o irmão em questão, for o Daniel, bom...
daí eu tiraria aquelas "aspas" da frase acima.

Nós mal tinhamos saído da sala de desembarque em Congonhas, na primeira conexão, quando vimos a guria segurando a placa:
"DOUTOR CORDIÓLIS U.S.P."

O Daniel não teve dúvida,
foi direto para guria e se apresentou, solenemente:

-Eu sou o Dr. Cordiólis!
-Muito prazer, Doutor. Seja bem vindo à São Paulo. Existe um transporte à nossa disposição para o deslocamento até a universidade, e...
-Mentira! Não sou, nãão!!

..."mas por quê você fez isto",
ainda murmurou a guria,
mas o Daniel já estava longe...

E eu e o Christiano, que nem tivemos tempo de tentar deter o nosso irmão,
não sabiámos se morríamos de vergonha,
ou de rir...

Ao contrário dos anos anteriores, a prova transcorreu inteira sob sol forte.
Um calorão carioca que impediu a maioria dos corredores de cumprir seus objetivos de tempo.
Viajei pensando em completar a prova em uma hora e quarenta e cinco minutos, fiz 1:48:15. Ok.
O melhor mesmo foi a companhia de meus dois irmãos, que também sofreram o diabo...
...mas nem por isso deixaram de completar a prova.

Foi noticiado como sendo maior assalto da história do país, o roubo de 156 milhões de reais do cofre-forte do prédio do Banco Central de Fortaleza, Ceará.
A polícia calcula que participaram da operação entre quinze e vinte pessoas.
Foi cavado um túnel de 78 metros de comprimento e 4 metros de profundidade.
O túnel ligou uma casa vizinha ao prédio assaltado e sua construção consumiu 3 meses de trabalho.
Por fim, foi perfurada uma laje de concreto armado com 1,5 metro de espessura.
O total roubado dividido pelo número presumido de participantes confere um mínimo de 7,8 milhões de reais para cada delinqüente.

Só que 156 milhões de reais corresponde a apenas um terço do movimento anual das contas correntes do empresário Marcos Valério, operador confesso do caixa 2 do partido do governo.
Um único cheque desta operação, nominal ao publicitário Duda Mendonça representou um saque de 15 milhões de reais.

Segundo as minhas contas, o assalto ao cofre-forte de fortaleza foi o SEGUNDO maior assalto da história do Brasil.

Fui dormir às 4 e o celular tocou às 9:
"Vamos correr?"
Senti os olhos meio arenosos, pensei nas doses de uísque e nas várias cervejas que bebi antes de deitar, na cama quentinha e no vento frio que bate no gasômetro.
"Vamos lá", respondi.
Afinal de contas, se o pintor pinta, se o vendedor vende, se o soldador solda,
então o corredor corre.

Só que o que me esperava na costa do guaíba era muito pior do que eu imaginei.
Um vento frio, castigando sem trégua, encrespando a água do rio e soprando uma umidade desgraçada por dentro do ouvido até chegar no cêrebro.
Pensei em desistir 3 vezes, e daí fui em frente.
Haviam poucos correndo, mas aqueles que hoje se cruzaram nas margens do Guaíba, são muito casca grossa.

No final fiz um treino rápido, 14k em 1:07:46.
Era o último fundão antes da meia maratona do Rio, domingo que vem, e foi feito no capricho...mesmo sob condições adversas.

Amanhã, 11 da noite, ESPN, começa o campeonato mundial de atletismo.
Por favor não me convidem para nenhum programa que me afaste da televisão, obrigado.

Já hoje...
...a noite será mais longa que a raia 8.

Dia 11 de Setembro haverá uma Maratona de Revezamento.
Serão 42k divididos em oito trechos iguais, cada pessoa corre um.
A idéia era mandar fazer, para a nossa equipe, camisetas com uma modernização da logotipia da Sogipa.
Sabe como é: Não sei se corremos rápido mas, com certeza,...bem uniformizados.
No final, optamos pelo logotipo tradicional, afinal são 138 anos de história!

A equipe:
Fabiano Saboya,
Christiano Saboya,
Roberto Corrêa da Silva,
Natacha Mascarello,
Clôvis Rodrigues,
Antônio Costa da Rosa,
Fabiano Ávila
e Patrícia Saboya.
Simona Arnez Saboya foi convidada, mas declinou.